Por Reinaldo Polito
Entre todas as lições de oratória que tive esta foi, sem dúvida, a mais curiosa. Ganhei de presente um livro excepcional, "El arte de hablar bien", de Paul C. Jagot e J.C. Noguin. O livro é uma obra comum e por si não mereceria um comentário tão entusiasmado. Trata-se de uma 2ª edição publicada na Argentina em 1943, traduzida do francês por J. G. Guiñon.O exemplar chama a atenção por ter pertencido ao poeta Guilherme de Almeida, que assinalou com mais ou menos destaque todas as passagens que considerou importantes na obra. O poeta leu e estudou o livro.
Sublinhou palavras e frases em praticamente todas as páginas, fez marcações e anotações nas margens e em diversas passagens escreveu comentários elogiando ou criticando o conteúdo. Promoveu um verdadeiro encontro da poesia com a oratória.
Prestou-nos um belíssimo serviço, pois o livro assim anotado e comentado nos dá uma excelente oportunidade de estudar e analisar como uma das cabeças mais privilegiadas da história cultural do país aprendeu a falar bem.
Selecionei e comentei dez tópicos que o poeta assinalou com maior destaque por serem esses, provavelmente, os que julgou mais relevantes.
1- Considero uma medida de higiene mental evitar discussões sem necessidade.
2- O sentimento de inferioridade oratória tem às vezes outro inconveniente: que determina em muitos casos a irritação, quando não os arrebatamentos de cólera. Perde-se então o sangue frio e ao antagonismo normal somam-se desnecessárias animosidades.
3 - Os piores defeitos físicos perdem muito do seu caráter repulsivo naqueles que falam de maneira encantadora. Por mais desagradável que seja a aparência do indivíduo, pode ser procurado, admirado, querido, se tiver uma maneira agradável de expor suas idéias, se cultivar sua voz, sua forma de articular as palavras, seu vocabulário e seu talento.
4 - O falar bem é atuar sobre si mesmo, vigiar a própria espontaneidade, obrigar-se ao cuidado da retidão, a uma atenção minuciosa, a um esforço de direcionamento das palavras empregadas na conversação.
5 - Com um mínimo de conhecimento sobre o tema e se mantiver a calma, falará com facilidade para milhares de pessoas como se estivesse falando para meia dúzia de ouvintes.
6 - Antes de falar, deve-se evitar os alimentos que exijam muito do organismo (álcool, açúcar e carne em excesso), a companhia de pessoas agitadas e muito falantes, as discussões inúteis, assim como fortes doses de café e de chá se elas o deixarem excitado.
7 - Adote uma atitude resoluta. Para isso, a autossugestão, praticada de forma afirmativa, contribui sempre para aquisição da segurança verbal. Ninguém está eternamente desprovido de elementos geradores de vigor psíquico.
8 - Ao acabar de ler o capítulo de um livro, resuma o conteúdo, o significado da mensagem da mesma maneira como se precisasse expô-lo diante de uma centena de pessoas.
9 - À noite, pouco antes de dormir, descreva minuciosamente seus feitos e atitudes do dia, construindo frases que expressem com clareza as informações de que puder se lembrar.
10 - Na fase de aprendizado, não convém ainda se preocupar com a elegância e a beleza da comunicação. Agora só interessa adquirir segurança e clareza. Por isso, é preciso repudiar as formas presunçosas, o purismo gramatical, as palavras incomuns e todas as expressões das quais ainda não tenha entendido perfeitamente o sentido.